
Os caminhos para a uma economia de baixo carbono ganharam novas configurações no país a partir das iniciativas que pudemos acompanhar neste mês. O Decreto 11.075/2022, publicado no dia último dia 19, que tratou dos procedimentos para a elaboração dos Planos Setoriais de Mitigação das Mudanças Climáticas e instituiu o Sistema Nacional de Redução de Emissões de Gases de Efeito Estufa – Sinare, aponta diretrizes para a formulação de um mercado regulado de carbono e sinaliza um posicionamento mais ativo do Executivo na direção dessa agenda, haja vista que sua divulgação ocorreu justamente no evento “Mercado Global de Carbono”, promovido pelo Ministério do Meio Ambiente, Petrobrás e Banco do Brasil, reunindo grandes lideranças empresariais, ministros e o presidente da República.
Contudo, em que pese a importância desse direcionamento governamental na busca de efetividade para o cumprimento das metas de redução dos gases de efeito estufa e, por conseguinte, do reconhecimento da urgência de esse tema para o setor produtivo, que há muito vêm se preparando e muitas vezes atuando de modo “autônomo”, ainda assim se fazem necessárias novas ações para que o Brasil possa realmente demonstrar todo o seu potencial no mercado de carbono e assumir um papel de protagonista em escala global. Assim, além da urgência na regulamentação no decreto de pontos que não ficaram bem definidos e que talvez possam gerar insegurança jurídica, e de ações específicas que ficaram a cargo do Ministério do Meio Ambiente e de outros, que irão requerer novos atos, ganha relevância no atual contexto a necessidade da retomada das discussões do Projeto de Lei 528/2021, que, se aprovado, deve propiciar maior confiança ao mercado pelo fato de ter a força de uma lei e de considerar outros aspectos que não foram previstos no decreto.
Ainda em maio, tivemos a oportunidade de celebrar os 10 anos da Lei Florestal 12.651/2012, que constitui um dos eventos mais importantes para a política ambiental brasileira, uma vez que possibilita um controle e a utilização adequada do nosso espaço territorial, e que ensejou, para a sua aprovação, um debate bastante intenso entre os setores mais representativos da sociedade brasileira, demandando um esforço conjunto das duas casas legislativas para que se chegasse a pontos de interesse comuns entre todos os envolvidos. Obviamente, não é uma norma perfeita, mas como adverte Boris Starck, o jurista não pode esperar por um Direito ideal, ele deve trabalhar com o Direito existente, em busca de soluções melhores, e é dessa forma que temos trabalhado com a aplicação da Lei Florestal, assim como de todo o arcabouço jurídico disponível para a área ambiental.
Convém lembrar também que, embora a lei tenha completado dez anos de vigência, alguns dispositivos presentes nela ficaram impedidos da sua plena implementação durante um razoável período de tempo, haja vista o surgimento de ações que questionavam a sua constitucionalidade no STF. Mesmo assim, passado o julgamento do STF, cujo acórdão foi publicado em 2019, ainda restam pendentes decisões acerca dos embargos.
Importante ainda ressaltar os avanços trazidos pela Lei com os instrumentos do Cadastro Ambiental Rural – CAR e o Programa de Regularização Ambiental (PRA). O CAR, como é de conhecimento, é um banco de dados público e eletrônico, obrigatório para todos os imóveis rurais, que permite o controle, o monitoramento, o planejamento ambiental e econômico, e que possibilita também o combate ao desmatamento ilegal. Apenas para demonstrar a magnitude desse sistema, de acordo com o Serviço Florestal Brasileiro, até o dia 11 de abril de 2022, haviam cadastrados 6,5 milhões de imóveis rurais, totalizando uma área de 612.567.861 hectares. No que tange ao Plano de Recuperação Ambiental – PRA, que depende da adesão ao CAR, a finalidade é permitir aos proprietários e posseiros rurais o desenvolvimento de um conjunto de ações que promovam a regularização ambiental. Assim, apesar das dificuldades dos Estados para validação dos dados declarados e de possíveis inconsistências que vêm sendo levantadas acerca do processo de georreferenciamento, e das consequências para o andamento do PRA, a nossa Lei Florestal continua sendo, com mais concretude do que os Códigos anteriores, a linha mestra de proteção à vegetação nativa e um caminho para a busca do desenvolvimento sustentável.
Reconhecendo a importância da Lei Florestal para a advocacia ambiental, o Conexão Milaré, o nosso canal no Youtube, foi dedicado inteiramente ao tema, contando com a participação de respeitáveis especialistas que dividiram conosco e com quem nos acompanha nas redes sociais as suas análises e experiências com a implementação da lei. Além disso, em parceria com o Portal Migalhas, realizamos o Webinar “Lei Florestal: uma análise após 10 anos”, justamente no dia 25 de maio, data em que se completaram os dez anos, com Reinhold Stephanes, que foi Ministro de Estado da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, os advogados Samanta Pineda e Leonardo Papp, do ambientalista e Deputado Federal Rodrigo Agostinho, e contando ainda com a minha participação e da nossa Leading Lawyer Juliana Flávia Mattei. Vale a pena conferir o conteúdo no Portal Migalhas (https://www.youtube.com/watch?v=_79w6epc3fU)
A situação de Pernambuco, mais uma vez, impõe a urgência dos planos de adaptação às mudanças climáticas e da necessidade de preparação de toda a população para o enfrentamento desses eventos extremos. Nossa solidariedade às famílias e o nosso pesar por todas as vítimas.
Édis Milaré
* Editorial publicado em nossa newsletter de maio de 2022