Rendemos nossas homenagens ao Papa Francisco, falecido na semana passada, destacando, entre os seus inúmeros feitos pelos direitos fundamentais e por um mundo mais pacífico, suas contribuições para a questão ambiental. Em particular, ressaltamos a relevância de duas de suas encíclicas: a Laudato Sì, publicada em 2015, que de certa forma exerceu alguma influência na assinatura do Acordo de Paris naquele ano, durante a COP21, realizada em Paris, e que é considerada o tratado mais importante relacionado ao clima, e sua continuidade, a Laudate Deum, em 2023. Ambas nos alertam sobre o equívoco antropocêntrico do homem perante a Terra e constituem documentos de alcance global, cujas diretrizes transcendem barreiras religiosas, dirigindo-se a todos os cidadãos, independentemente de seu credo ou não.
A adoção de um nome franciscano, em referência a São Francisco de Assis, famoso como patrono da natureza e por sua conexão com os animais, por um papa de formação jesuíta, já indicava em 2013, quando iniciou sua missão, que a natureza também desempenharia um papel significativo em seu pontificado.
Assim, é inegável o reconhecimento de que o pontífice ecoou uma voz para o mundo de respeito à nossa casa comum. Na Encíclica Laudato Sì, ele aduz: “Nunca maltratamos e ferimos a nossa casa comum como nos últimos dois séculos. […] Torna-se indispensável criar um sistema normativo que inclua limites invioláveis e assegure a proteção dos ecossistemas, antes que as novas formas de poder derivadas do paradigma tecnoeconômico acabem por arrasálos não só com a política, mas também com a liberdade e a justiça” (Cap. I, n. 6, item 53).
A crise climática esteve no cerne da Laudate Deum.
No início de sua reflexão, o pontífice sublinha que: “Já passaram oito anos desde a publicação da carta encíclica Laudato si’, quando quis partilhar com todos vós, irmãs e irmãos do nosso maltratado planeta, a minha profunda preocupação com o cuidado da nossa casa comum. Mas com o passar do tempo, dou-me conta de que não estamos a reagir de modo satisfatório, pois este mundo que nos acolhe está-se esboroando e talvez aproximando dum ponto de ruptura. Independentemente desta possibilidade, não há dúvida que o impacto da mudança climática prejudicará cada vez mais a vida de muitas pessoas e famílias. Sentiremos os seus efeitos em termos de saúde, emprego, acesso aos recursos, habitação, migrações forçadas e noutros âmbitos.”
Num dos momentos mais angustiantes vivenciados pela humanidade nos últimos tempos, que foi a pandemia da covid19, impossível esquecer da imagem do pontífice solitário na praça de São Pedro, que estava ali em um gesto cercado de simbolismo rezando e emanando esperança e solidariedade a todos, lembrando especialmente as famílias enlutadas e aqueles que estavam no front da batalha, como os profissionais da saúde. Independentemente das crenças e religiões, essa cena foi um gesto muito forte de um verdadeiro consolo em um momento de crise global sem precedentes.
Resta-nos agradecer a ele pelos seus feitos e desejar que seu legado de proteção ambiental da nossa casa comum permaneça e que possa ser multiplicado pelas futuras gerações.
Édis Milaré