EDITORIAL

Tema: Editorial

31 de outubro de 2021

Há muita expectativa em relação à Conferência do Clima, a COP-26, que tem início hoje, em Glasgow, na Escócia, para que as nações, sobretudo as grandes potências mundiais, revejam, mais uma vez, suas metas e tenham posições mais ambiciosas para a diminuição das emissões dos gases de efeito estufa, diante de um cenário tão avassalador que se vem apresentando com os eventos meteorológicos extremos em diversas partes do mundo, e para que se afaste em definitivo o ponto de irreversibilidade do aquecimento, apesar de alguns cientistas já sinalizarem que talvez isso não seja possível. Logo, resta-nos ter a esperança de que prevaleçam alguns ideais “iluministas” nas decisões dos líderes mundiais e que seja um encontro que propicie uma mudança histórica para o futuro do nosso planeta.

Na matéria da Revista Exame que foi publicada na última sexta-feira, intitulada “Cop-26: 18 grandes nomes falam de suas expectativas para o evento”, dei um depoimento sobre a reunião, no qual destaco alguns pontos de extrema relevância para os avanços que são aguardados, entre os quais a transparência dos relatórios a serem apresentados pelas partes; a edição de normas complementares do Rulebook do Acordo de Paris, em especial o art.6º, sobre cooperação em ações de mitigação; o cumprimento do Programa de Nairóbi sobre adaptação aos impactos da mudança do clima; a operacionalização da Rede de Santiago sobre perdas e danos; a definição das metas de financiamento; e a periodicidade de revisão das contribuições nacionalmente determinadas (NDCs). Além disso, afirmei que  existe um “gap” considerável entre o conteúdo das NDCs já apresentadas e aquilo que seria necessário para a redução de emissões, mas que espero que a reunião em Glasgow propicie a criação de um ambiente de governança adequado à colaboração interestatal equitativa. Ainda disse que no plano nacional cada Estado-parte deverá revisar a sua legislação para assegurar a implementação efetiva e acelerada de sua respectiva NDC, que será, a meu ver, outro tema vital e controverso a ser tratado em Glasgow.

Em relação ao nosso país, em que pese a perda do nosso protagonismo, é importante destacar as contribuições dos grupos empresariais que estarão na COP-26 reafirmando os seus compromissos com a responsabilidade socioambiental e com uma agenda que possa contribuir com a descarbonização e com a economia verde. 

Um passo importante também foi dado neste mês em âmbito global na direção de um meio ambiente saudável com o reconhecimento pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU de que o “meio ambiente limpo, saudável e sustentável é um direito humano”. Embora a resolução deva sofrer algumas complementações, uma vez que será encaminhada à Assembleia Geral da ONU em Nova Iorque, há muita expectativa depois dessa decisão para que os Estados-membros adotem políticas públicas “imediatas” e “reais” que garantam condições dignas de vida às suas populações, o que inclui um meio ambiente ecologicamente equilibrado e protegido.

Tal medida também se revela uma mudança de paradigma e se deve em parte aos efeitos devastadores causados pela pandemia nas economias globais e que demonstraram haver, em certa medida, uma influência no surgimento de novos vírus com os desmatamentos das florestas, a perda da biodiversidade, as mudanças climáticas, enfim, com a degradação ambiental.

No Brasil, em que pese as interferências dos governos no cumprimento das políticas públicas fundamentais, importa destacar o avanço da nossa Constituição na direção de um “direito humano” nos dispositivos que tratam da temática ambiental, haja visto que quando o caput do art. 225 estabelece que: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”, equipara o meio ambiente ecologicamente equilibrado a outros direitos humanos fundamentais, como a vida, a saúde, a segurança alimentar e o acesso à água. 

Contudo, convém lembrar que o termo “todos” em nosso ordenamento jurídico é bastante polêmico em virtude do caráter antropocêntrico da nossa Constituição, deixando “em aberto” se estariam incluídos nessa abrangência os animais e as plantas, o que não descarta, por óbvio, a necessidade de proteção de todos os elementos que integram o meio ambiente e que já guarda amparo em nosso texto pátrio. 

De toda forma, temos identificado um movimento no contexto jurídico de reconhecimento como sujeito de direitos animais e a própria natureza, tendo surgido diversas demandas em que esses seres foram inseridos como partes, o que demonstra, como tenho comentado ultimamente, a incorporação de uma visão ecocêntrica para a matéria. 

Na linha das mudanças que vêm ocorrendo no sentido de garantir direitos e proteção aos animais, foi sancionada pelo presidente, também neste mês, a lei que proíbe a eutanásia de cães e gatos de rua pelos órgãos de controle de zoonoses, canis públicos e demais estabelecimentos similares, exceto em situações de doenças graves ou infectocontagiosas incuráveis que representem riscos à saúde humana e de outros animais. O descumprimento da lei prevê penalidades previstas na Lei de Crimes Ambientais. 

Que venha novembro com boas notícias.

   Édis Milaré

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