Minuta de Acordo sob a Convenção da ONU sobre o Direito do Mar: Conservação e Uso Sustentável de Biodiversidade Marinha em Áreas além da Jurisdição Nacional

31 de março de 2023

Por Flavia Rocha Loures (*)

Depois de quase 20 anos de negociações, foi aprovada no dia 4 de março na sede da ONU, em Nova York, a minuta de acordo sob a Convenção da ONU sobre o Direito do Mar: Conservação e o Uso Sustentável da Biodiversidade Marinha além da Jurisdição Nacional. O futuro acordo é importante, pois viria para endereçar fragmentação jurídico-institucional, cobrir lacunas de governança no tema e regulamentar uma porção do mar onde todos os países podem pescar, explorar a navegação e realizar pesquisa; mas nenhum país, por si só, possui a responsabilidade de a proteger. Essa situação reflete a chamada Tragedy of the Commons.

O alto-mar representa 2/3 dos oceanos e sua biodiversidade é rica, porém altamente vulnerável a ações antrópicas (10% em risco de extinção) e ainda pouco conhecida. Ameaças incluem poluição, em especial por plásticos (objeto de outras negociações internacionais), e sobreexplotação de pescados. Ao mesmo tempo, o conceito de economia azul ilustra a importância de se assegurar o uso sustentável dos recursos e a conservação dos ecossistemas do alto-mar. 

Os aspectos-chave da minuta incluem: (i) fortalecimento e padronização de parâmetros para a realização de estudos de impacto ambiental; (ii) diretrizes para a criação de áreas de conservação marinhas, as quais, quando bem geridas, têm proporcionado benefícios ambientais, mas ainda cobrem apenas 1.4% da região; (iii) arranjos para acesso e repartição de benefícios associados a recursos genéticos marinhos; (iv) governança institucional (inclusive conferência das partes, secretariado, órgão técnico-científico, mecanismo clearing-house  e órgão de implementação e compliance); e (v) capacitação, transferência de tecnologia e canais de financiamento; e (vi) dispositivos sobre prevenção e resolução de disputas.

O futuro acordo serviria como base para: (i) o fomento ao equilíbrio entre os países em desenvolvidos (que possuem os recursos para explorar) e os países em desenvolvimento (que, em grande parte, têm ficado de fora desses esforços); (ii) o melhor direcionamento de assistência financeira, geração de dados, desenvolvimento e intercâmbio científico e deployment de tecnologia; (iii) a adoção e harmonização de acordos regionais e a atuação coordenada de órgãos internacionais; (iv) o fortalecimento do Marco Global de Biodiversidade quanto à criação de áreas protegidas e outros espaços conservados; (v) a reafirmação da importância do direito internacional do meio ambiente; e (vi) a demonstração de como questões ambientais podem congregar os países em torno de interesses comuns.

Os próximos passos para efetividade do acordo seriam a adoção oficial da minuta, a abertura do processo de ratificação, a entrada em vigor (após 60 adesões), a implantação dos órgãos de governança e a adoção ou eventual revisão de legislações nacionais e acordos regionais.

(*) Consultora do Milaré Advogados para assuntos de Direito Internacional Ambiental e Comparado.

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