O que pensa a nova geração do Direito Ambiental

28 de fevereiro de 2021

Constituída na experiência e trato diário das questões ambientais no trabalho em nossas equipes, a nova geração do Direito Ambiental nem sempre teve muita familiaridade com a matéria durante o período de formação acadêmica de graduação. Integrada por alguns que acabaram de sair das universidades e por outros que concluíram seus cursos há pouco mais de um ano, foi somente com o estágio no Milaré Advogados que esses jovens puderam se aprofundar no tema e desmistificar a visão, por vezes pueril, que tinham a respeito da atuação na área, restringindo o campo do Direito Ambiental aos temas relacionados aos cuidados da fauna e flora. A partir dos primeiros contatos e com aperfeiçoamento da matéria, durante o período do estágio, muitos deles passaram a cultivar enorme interesse pela área e, hoje em dia, vislumbram a possibilidade de se firmarem como futuros especialistas. 

Conversamos com esses jovens advogados para saber de que forma tiveram contato com a área e o que pensam atualmente sobre os rumos do Direito Ambiental no Brasil. São eles: Alexandra Cantarelli, Bianca Pinheiro, Giovanna Arbia Chiarella, José Paulo Roriz, Julia Crauford e Louise Marie do Nascimento Ynoue.

Newsletter Milaré Advogados (NMA): Como vocês tomaram conhecimento do Direito Ambiental? Na faculdade ou já conheciam a disciplina?

José Paulo: Sempre tive interesse pela área, mas pelo fato de a disciplina de Direito Ambiental ser dada geralmente no final do curso, o aprendizado que tive foi no escritório. A faculdade deu uma breve introduzida na área, mas foi primordial o escritório. O escritório é uma escola sim, há muito aprendizado aqui e a área exige também muito da formação acadêmica, exige muito estudo. Aqui a gente pode acompanhar diversos eventos, participar de várias palestras sobre o tema, estar por dentro de tudo o que está acontecendo. Mas, quando a gente entra no escritório, a gente se surpreende: às vezes, as coisas são como a gente pensava, e outras, não. A partir do momento em que entrei no escritório, conheci um mundo totalmente diferente do que eu imaginava.

Louise: Eu fiz outros estágios antes de entrar no Milaré, e em outros escritórios a prática era bastante mecanizada, envolvendo questões, basicamente, de cunho administrativo. Acabei tomando conhecimento da vaga no Milaré Advogados por intermédio de um colega de sala que me disse que a dinâmica do escritório era totalmente diferente. Constatei na prática o que esse amigo havia me dito, pois aqui o aprendizado é constante, desde o início tive a oportunidade de realizar muitas pesquisas, escrever e apoiar diretamente os advogados da minha equipe em seus trabalhos. Assim, aos poucos, o meu contato com a área ambiental foi sendo ampliado, pois, a princípio, eu pensava que lidaria apenas com questões ligadas à fauna e à flora, mas, com o passar do tempo, percebi a interface com outros ramos do Direito e outras áreas de conhecimento, dada a interdisciplinaridade do tema. Com a prática do estágio, somada às diversas oportunidades de aprendizado que minha equipe sempre me deu,  fui conhecendo melhor a área e hoje em dia eu tenho plena certeza de que o Direito Ambiental é  a área que definitivamente abracei e pretendo nela me desenvolver.

Bianca: Na minha casa sempre tivemos uma preocupação com as questões ambientais, meus pais sempre estiveram envolvidos em diversos tipos de voluntariados, inclusive destinados à proteção ambiental; então, existia um interesse natural da minha parte pela área. No início da faculdade, eu ainda não tinha a dimensão de que área do direito gostaria de seguir, e o contato que tive com o Direito Ambiental no curso foi raso; só um dia de estágio no Milaré Advogados equivale a todo o conteúdo do curso. Então, a partir do momento em que tive contato com a área ambiental no escritório percebi que, realmente eu gostaria de construir uma carreira no Direito Ambiental.   

Julia: Eu entrei no escritório antes de ter a matéria na graduação, então eu não tinha ideia do que era o Direito Ambiental. A visão que eu possuía anteriormente era bem limitada, e somente a partir da atividade prática no escritório é que eu ampliei o meu entendimento do que realmente se trata na área. 

Giovanna: Quando entrei na faculdade, não sabia nem que existia o ramo do Direito Ambiental. Não sabia que uma pessoa poderia estudar e se profissionalizar em Direito Ambiental, como fez o doutor Édis. Na minha experiência acadêmica, no Mackenzie, tivemos um breve contato com a matéria apenas no 8° semestre, quase no final do curso, e de uma forma apenas introdutória. Então posso afirmar que tudo o que aprendi foi no escritório, e isso a gente pode falar com muita propriedade: o Milaré é uma escola, é verdadeiramente uma escola.

Alexandra: A verdade é que eu só fui fazer Direito para trabalhar com o Direito Ambiental. Desde o fundamental, desde o colegial (ensino médio), eu sempre quis trabalhar com o meio ambiente. Mas, como sou muito voltada à área de humanas, eu não me via cursando engenharia ou gestão ambiental. Como tenho duas primas que também fizeram Direito, e sempre me espelhei muito em uma delas, tudo o que ela me contava sobre o curso e sobre a profissão foi o que me fez decidir cursar Direito, voltando para o Direito Ambiental muito antes de ingressar na faculdade. E, de fato, quando pude entrar em contato com a área no 3° semestre do curso, apesar de ser de forma bastante rasa, foi o suficiente para me apaixonar pela matéria. 

Newsletter Milaré Advogados (NMA): E, como jovens advogados no Direito Ambiental, quais são os desafios da área?

José Paulo: O principal desafio da área é dominar um pouco mais da parte técnica, porque há muitos advogados que entendem muito de processo, de procedimento, mas às vezes levam um pouco mais de tempo para entender como funciona o ambiental propriamente dito. No ambiental, há muitas especificidades, muitas partes que dependem de um conhecimento técnico, de contato com vários técnicos, então, entender isso é fundamental. É indispensável para qualquer advogado ter o conhecimento processual, mas, para a área ambiental, é importante aliar isso com as especificidades técnicas que a área exige. 

Louise: Um importante desafio é acompanhar a evolução das normas, considerando que é uma área que muda rapidamente os entendimentos, há variações nos Estados e nos municípios. Como não existe ainda um compilado de normas – ou, melhor, um Código Ambiental, como sempre defendido pelo professor Édis –, há muitas divergências de entendimentos, tendo em vista que nem todos os assuntos estão pacificados. É muito importante estar atento permanentemente às mudanças. O Direito Ambiental é uma área muito dinâmica, que requer contínua atualização e bastante estudo. 

Giovanna: Complementando o que a Louise mencionou, além de haver diferenças de entendimentos nos tribunais, o valor do meio ambiente em si também guarda suas distinções, pois a flora e a fauna têm valores díspares nas diversas regiões do país, como, por exemplo, uma área de Mata Atlântica no Mato Grosso do Sul não tem a mesma valoração de uma área, também de Mata Atlântica, localizada no litoral norte do Estado de São Paulo. Então, compreender essas diferenças também é de suma importância para quem atua na área, é um desafio diário ter que observar as especificidades que envolvem a área ambiental. 

José Paulo: Um outro ponto muito importante também é acompanhar as decisões do STJ, do STF, de julgados que tenham semelhanças com as ações que estejam sob a sua responsabilidade. 

Giovanna: Isso que o José falou é um desafio bem específico da área ambiental. Temos decisões divergentes de tribunais todos os dias em vários ramos do Direito, mas, especificamente no Direito Ambiental, isso é muito mais dinâmico, diário e oscilante.

Louise: E no Direito Ambiental há muitas situações que são únicas, que ainda não ocorreram e que, consequentemente, não há jurisprudência ou comentário em nenhuma doutrina. Mas, no Milaré Advogados, nós temos o doutor Édis, que é o doutrinador referência na área, então, em situações únicas, as análises e pareceres emitidos por ele tem um peso enorme, ou seja, é a doutrina pura.

Newsletter Milaré Advogados (NMA): E quais dicas vocês teriam para quem gostaria de atuar na área?

Julia: Muitas vezes, as pessoas vão entrar na área e não vão saber o que é o Direito Ambiental. Então, indicar simplesmente que estudem noções preliminares da matéria não é o conselho mais adequado, porque, por muitas vezes, na prática, o caminho se torna diferente. Mas, se fosse para eu dar uma dica aos interessados, seria saber se gostam de estudar, porque o dia a dia do Direito Ambiental demanda diariamente estudos, conhecimentos e saber transitar por diversas áreas, como o Processo Civil, Tributário, Empresarial, Penal, conhecer o Direito Contratual. Aqui a gente abre o livro todos os dias, requer muito estudo. Afinal, o Ambiental em si é o nosso diferencial, é a nossa especialização, é uma área que a gente vai estudar para sempre. Em qualquer área há muitas mudanças também, de jurisprudência etc., mas o diferencial do Milaré Advogados é que aqui é feita a doutrina, aqui temos o doutor Édis Milaré, mas, daqui a dez, quinze anos, seremos nós a continuar todo o legado. 

Newsletter Milaré Advogados (NMA): E quais expectativas para a área do Direito Ambiental?

Giovanna: Na minha opinião, existe um desafio em relação à produção de conteúdo sobre a matéria ambiental, pois, diferentemente das outras áreas jurídicas já consolidadas, uma área como o ambiental ainda é relativamente carente de material e fontes de pesquisa, especialmente no que diz respeito à construção de teses jurídicas para defesa dos interesses de empresas envolvidas em questões ambientais. A maioria das obras foi escrita com foco exclusivamente acadêmica, sem a abordagem das questões mais comuns do dia a dia das corporações. 

Louise: Atualmente, é perceptível que há uma grande preocupação das empresas com os passivos ambientais, com a pauta socioambiental e o conceito ESG, então, eu vejo uma expansão do Direito Ambiental. É sabida a importância e o peso das questões ambientais para a construção de qualquer empreendimento, seja ele de pequeno, médio ou grande porte. Não é por outra razão que, constantemente, as empresas buscam a realização de Due Diligence Ambiental ou a análise qualitativa do próprio licenciamento ambiental do empreendimento. Denota-se uma preocupação em estar de acordo com questões ambientais.

José Paulo: Um outro ponto ocorre no próprio Judiciário, que teve uma iniciativa importante e recente. O STF e o CNJ lançaram o Observatório de Meio Ambiente para acompanhar em tempo real o que acontece na área, como o desmatamento na Amazônia. Eles estão com uma plataforma supermoderna, dinâmica, para acompanhar tudo o que ocorre. E o próprio presidente do STF, o ministro Fux, disse que eles têm a preocupação de entender mais a área, pois muitas questões ambientais chegam para os ministros decidirem, e nem sempre eles conhecem as especificidades sobre o tema. Então, é algo que demonstra a projeção do Direito Ambiental.

Bianca: Com o contato diário com o ramo do Direito Ambiental, sentimos que há muita legislação na área e nem sempre há legislação específica sobre determinados assuntos, ou seja, muita legislação, porém de forma desorganizada. Também, como já mencionado, não existe uma legislação compilada, causando muitas vezes divergência na interpretação das normas entre Estados, então, são questões que merecem uma atenção especial.

Alexandra: Acredito que as mudanças climáticas devem protagonizar o cenário do Direito Ambiental nos próximos anos, visto que, agora, muitas empresas e instituições financeiras têm demonstrado preocupação com o tema. De fato, trata-se de algo que transcende toda a nossa sociedade, em todos os aspectos, e eu considero que há uma tendência de crescimentoem relação a isso. Eu observei que, no último ano, com o impulso da pandemia, a questão das mudanças climáticas passou a ser cada vez mais noticiada e deflagrada pelos meios midiáticos, além de chamar a atenção de grandes empresários, que agora manifestam interesse pelo desenvolvimento sustentável. Não só, mas até houve a colocação, em Nova York, de um relógio que faz uma contagem regressiva para alertar que faltam sete anos para os efeitos das mudanças climáticas serem irreversíveis. Além dessa questão, há um outro ponto, sobre o qual muitos já falaram aqui, acerca do excesso de leis ambientais e do quanto as normas são esparsas, e, realmente, nesse sentido, um Código Ambiental seria muito importante para a área. 

Giovanna: A falta de uma legislação única consolidada para a área é um real desafio. O Código Ambiental que tem sido defendido pelo doutor Édis é de suma importância… 

Julia: Os desafios a serem enfrentados… Muitas vezes, há um ativismo por parte do Judiciário, que acaba legislando sobre diferentes assuntos, há muitas normas que se tornam contraditórias, dada a velocidade das mudanças da matéria  e por isso nem sempre acompanham o dinamismo da área, e se tornam incoerentes… Enfim, a edição de um Código Ambiental, como tem sido dito pelo doutor Édis Milaré, seria muito bem-vindo.

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