Com êxito, chega ao fim Ação Civil Pública de importância histórica para a tutela coletiva dos interesses transindividuais

30 de setembro de 2023

Neste mês, depois de quase quarenta anos de tramitação, o Ministério Público do Estado de São Paulo, por meio do Grupo de Atuação Especial do Meio Ambiente – GAEMA da Baixada Santista, extinguiu a Ação Civil Pública contra 17 empresas do Polo Petroquímico de Cubatão, a partir da homologação de acordo. O procedimento resultou na condenação das signatárias ao pagamento de quase 143 milhões de reais – valores referentes a maio de 2021, quando o acordo foi firmado – sem que houvesse, por parte delas, o reconhecimento de responsabilidade ou culpa pelos fatos ou alegações contidos na inicial. Esse montante, cujos valores individualizados de cada empresa já foram comprovados, será aplicado na implementação do “Projeto de Urbanização Integrada e Reassentamento de Moradias em Áreas de Risco e Proteção Ambiental – Vila Esperança”, do município de Cubatão, que compreende “a construção de uma Avenida Perimetral nas ocupações consolidadas da Vila Esperança, instalação de infraestrutura urbana e melhorias ambientais como rede de esgoto, drenagem e demais obras necessárias à comunidade, com remoção de famílias de áreas de risco e construção de unidades habitacionais”. 

Proposta em 15 de janeiro de 1986 pelo nosso sócio Édis Milaré, que naquela época ocupava o cargo de Procurador de Justiça do Ministério Público de São Paulo, em conjunto com a entidade ambientalista OIKOS, liderada pelo ex-deputado Fábio José Feldmann, a ACP ora extinta representa um marco na tutela coletiva dos interesses transindividuais, revestindo-se de enorme importância para os avanços na política de proteção ambiental em nosso país, dado o seu pioneirismo, por ter sido a primeira ação com a entrada em vigor da Lei da Ação Civil Pública (Lei N° 7.347, de 24 de julho de 1985), por ter confrontado um conglomerado empresarial e por envolver a degradação de ecossistema representativo, a Mata Atlântica, que corresponde a grande parte da cobertura vegetal das encostas da Serra do Mar.

Contudo, é importante ressaltar o contexto em que se deu essa ação, considerando que a realidade de hoje, tanto do município de Cubatão, como dos compromissos socioambientais das empresas envolvidas, é bem diferente do que era nos anos 1980. Naquela época, o município de Cubatão abrigava o principal polo petroquímico do país, responsável pela quase totalidade da arrecadação tributária do Estado de São Paulo. Ao mesmo tempo, era mundialmente conhecido como “Vale da Morte” e chegou a ser apontado pela ONU como o município mais poluído do mundo, uma vez que as atividades industriais, eram em geral exercidas sem observância das cautelas necessárias para impedir danos ao meio ambiente e à saúde da população.

No pedido inicial da ação, demandou-se a condenação das empresas rés “a responder, solidariamente, pelo pagamento de indenização a ser fixada em oportuno processo de liquidação por arbitramento, indenização esta que deve corresponder ao custo integral da completa recomposição do complexo ecológico atingido, até a data da perícia, de modo que este readquira, qualitativa e quantitativamente, os atributos anteriores ao início do processo de poluição”, sob o argumento de que “o lançamento continuado de poluentes na atmosfera, por parte das requeridas, entre inúmeros outros danos, ocasionou a degradação e o perecimento de grande parte da cobertura vegetal das encostas da Serra do Mar, numa área de aproximadamente 67,0 km2”. 

No curso da ação, contudo, até se chegar à sentença condenatória, proferida somente em 2017 e que acolheu os embargos de declaração do Ministério Público, confirmando a procedência integral da ação, constatou-se que, ao longo dos anos, uma série de medidas tomadas pelas administrações públicas e empresas alteraram a realidade fática da região, dotando-a de condições mais adequadas à saúde e à qualidade ambiental, como a implantação de novas e modernas tecnologias “voltadas ao aprimoramento do controle ambiental de emissões atmosféricas, efluentes líquidos e resíduos sólidos, implicando controle integral (100%) das fontes primárias de poluição do Polo Petroquímico de Cubatão”. Vale lembrar que na “Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente realizada no Rio de Janeiro, em 1992, foi outorgado à cidade de Cubatão o Selo Verde como “Cidade Símbolo Mundial da Recuperação Ambiental” e que em 2012, por ocasião da realização da Rio+20, renovaram-se os votos para “Cidade Símbolo da Sustentabilidade”. 

Além disso, em 2015, em parecer técnico, o Centro de Apoio Operacional à Execução – CAEx do GAEMA da Baixada Santista, também “atestou que “a área atingida [67,0 km2 do complexo ecológico da Serra do Mar] foi restaurada” e “houve ações, por partes das indústrias e do poder público, de modo a cessar (ou minimizar) a conduta poluidora e, considerando também, que a natureza se encarregou de parte da restauração [do complexo ecológico da Serra do Mar]”.

Inegavelmente, essa ação emblemática transcendeu a expressiva quantia acordada, impulsionando em paralelo, ao longo dessas quase quatro décadas, investimentos de bilhões de reais em medidas de adequação das atividades industriais às mais modernas e inovadoras tecnologias, em consonância com os avanços nas legislações ambientais. Os investimentos estenderam-se, ainda, a processos de recomposição das áreas degradadas e à prestação de assistência às populações e comunidades locais. Evidencia-se, portanto, um esforço sinérgico das mais variadas entidades envolvidas na dinâmica local – sejam elas públicas ou privadas, pertencentes ao judiciário ou à sociedade civil organizada. 

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