Licenciamento  ambiental de usinas fotovoltaicas flutuantes

31 de May de 2024

Por Maria Clara Rodrigues A. Gomes

O debate a respeito do desenvolvimento de uma economia de baixo carbono leva-nos também a refletir sobre a transição energética e, por consequência, os meios de aprimoramento das energias renováveis e as múltiplas possibilidades existentes. 

Nesse sentido, vale mencionar que o Brasil, ao ratificar o Acordo de Paris, promulgado pelo Decreto Federal 9.073, de 05.06.2017, assumiu o compromisso de “expandir o uso de fontes renováveis, além da energia hídrica, na matriz total de energia para uma participação de 28% a 33% até 2030”.

A produção da energia solar (fotovoltaica) vem se expandindo nesse cenário com novas tecnologias e novos empreendimentos, como é o caso das usinas fotovoltaicas flutuantes, que associam o potencial de produção energética a partir da luz solar e os espaços de reservatórios e espelhos d’água, o que vem ocorrendo no Brasil e no mundo. Em grande parte, a implantação desses empreendimentos vem sendo integrada a usinas hidrelétricas existentes, que já possuem toda a infraestrutura de transmissão da energia a ser produzida nas fotovoltaicas flutuantes.

Para a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo – CETESB, que em abril/2024 autorizou a operação de uma usina fotovoltaica flutuante no reservatório da Represa Billings, a “utilização de espelhos d’água para a instalação de parques solares flutuantes traz vantagens em relação às usinas terrestres, uma vez que a instalação de usinas solares fotovoltaicas necessita de grandes áreas, as quais muitas vezes são cobertas por vegetação nativa que precisa ser suprimida.”1 Outra vantagem apontada pela CETESB é a redução da evaporação de água dos reservatórios.

E, de fato, empreendimentos dessa natureza têm evidenciado baixos impactos ambientais, sem enfrentar as restrições ao uso de terras, comuns nas fotovoltaicas terrestres, com a otimização de espaços para a produção de energia “verde”. 

Segundo estudo produzido pela Empresa de Pesquisa Energética – EPE, de 2020, acerca dos Aspectos Tecnológicos e Ambientais Relevantes ao Planejamento para usinas solares fotovoltaicas2, citam-se vantagens, como ganho de eficiência decorrente da menor temperatura de operação dos reservatórios d’água, além de sua potencial redução da evaporação. No entanto, desvantagens também são apontadas, decorrentes de potenciais impactos nos organismos aquáticos (sobretudo ictiofauna), o acúmulo de dejetos de pássaros e sujidade. Existem ainda os impactos sociais, relacionados aos usos dos reservatórios pelas comunidades locais para atividades como pesca (esportiva e de consumo), navegação, recreação, entre outros, de forma que a implantação dessas usinas deve ser considerada nesse contexto. Evidencia-se, dessa forma, ser necessário o aprofundamento dos estudos relativos aos custos e aos impactos desses projetos.

É válido observar também que esse tipo de empreendimento tem ocasionado interesse não apenas aos concessionários das usinas hidrelétricas, mas também aos outros agentes com demanda de energia para consumo próprio. Em tal hipótese, se discute, por exemplo, a viabilidade de usinas particulares, a quem caberia autorizar o uso do reservatório/espelho d’água, como se daria a relação junto ao concessionário, assim como sobre limitações quanto a tamanho e capacidade dos projetos.

Por todos esses aspectos, têm se mostrado desafiadores o licenciamento ambiental desses empreendimentos, que também são influenciados pela falta de regulamentação nacional da matéria, e as esparsas legislações estaduais que, quando muito, mencionam esse tipo de empreendimento sem estabelecer regras específicas, o que leva a licenciamentos díspares, por exemplo, quanto à tipologia de Avaliação de Impacto Ambiental – AIA cabível. Nesse sentido, aliás, tem-se verificado alguns órgãos ambientais licenciadores adotando posturas mais conservadoras, com exigências mais rígidas quanto aos estudos e monitoramentos cabíveis, justamente devido ao desconhecimento dos efeitos desses empreendimentos3

Denota-se, assim, a necessidade de ampliar o debate sobre o licenciamento ambiental desses empreendimentos e de definir critérios não só do ponto de vista ambiental, mas também, e sobretudo, regulatórios, a fim de estimular essa tipologia de empreendimento que se mostra como mais uma fonte alternativa de produção energética mais limpa, mediante a segurança jurídica esperada.

1 https://cetesb.sp.gov.br/blog/2024/04/30/usina-fotovoltaica-flutuante-na-billings-obtem-lo/ Acessado em maio/2024
2 https://www.epe.gov.br/sites-pt/publicacoes-dados-abertos/publicacoes/PublicacoesArquivos/publicacao-466/NT%20Solar%20Fotovoltaica%20Flutuante.pdf Acessado em maio/2024
3 A própria EPE (2020) destaca não haver uma definição quanto às autorizações necessárias às usinas fotovoltaicas flutuantes, ao aludir que “a depender do tipo de reservatório, podem ser necessárias autorizações da Agência Nacional de Águas (ANA), Marinha do Brasil, Capitania dos Portos, entre outros órgãos. As legislações de base que disciplinam o gerenciamento de recursos hídricos, no âmbito federal, são a Lei n. 9.433/1997, que institui a Política Nacional de Recursos Hídricos e a Lei n. 9.984/2000, que dispõe sobre a criação da Agência Nacional de Águas (ANA). Adicionalmente, existem normativas específicas publicadas tanto pela ANA quanto pelos Estados da Federação e Distrito Federal, bem como deliberações do Conselho Nacional de Recursos Hídricos e Normas da Autoridade Marítima – NORMAM expedidas pela Marinha. Dado o ineditismo da tecnologia, ainda não há clareza quanto à necessidade de autorizações em cada caso.”

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