Um balanço da COP 28

21 de dezembro de 2023

Por Thiago Sales Pereira, Bianca Vieira Pinheiro e Giovanna Krist

A 28ª Conferência das Partes – COP1 ocorreu em Dubai, Emirados Árabes, de 30 de novembro a 13 de dezembro de 2023, e trouxe negociações efetivas de alguns temas que se vinham desdobrando desde os últimos encontros, entre eles a manutenção da meta de conter o aquecimento global em 1,5ºC.

Ainda que criticada, a versão final do Primeiro Balanço Global do Acordo de Paris2 (First Global Stocktake) reafirmou estudos que apontam para a existência de efetivo impacto decorrente da ação humana em relação ao já verificado aquecimento de 1,1ºC na temperatura média global.

Entre os assuntos tratados na COP 28 destacam-se a criação do Fundo de Compensação de Perdas e Danos, o Acordo de Transição de Combustíveis Fósseis, a Redução de Emissão de Gás Metano, o Acordo de Descarbonização e a Declaração sobre Agricultura Sustentável, Sistemas Resilientes e Ação Climática. No que se refere à participação do Brasil, convém ressaltar a apresentação do Plano de Transição Ecológica e do Financiamento ofertado pelo BNDES para restauração da Amazônia.

Fundo de compensação de perdas e danos 

Logo no primeiro dia a COP aprovou-se a criação de um Fundo de Compensação de Perdas e Danos, cujo objetivo é priorizar a destinação de recursos a países vulneráveis às mudanças climáticas, cumprindo, assim, um dos compromissos acordados na COP anterior. Durante os primeiros quatro anos o fundo será gerido pelo Banco Mundial e administrado por um conselho formado por 26 membros: 14 representantes de países pobres ou emergentes e 12 de países desenvolvidos.

Apesar de não ter havido definição de cotas (houve apenas sugestão para que países desenvolvidos contribuíssem) foram anunciadas algumas doações: a União Europeia doou US$ 245 milhões, a Alemanha e os Emirados Árabes contribuíram com US$ 100 milhões cada e o Reino Unido destinou US$ 50 milhões ao Fundo e outros US$ 25 milhões para eventuais arranjos financeiros. Por fim, os Estados Unidos e o Japão confirmaram doações no montante de US$ 17 e 10 milhões, respectivamente.

Transição Energética e uso de combustíveis fósseis

A ambição de ambientalistas e representantes de países mais vulneráveis ao aquecimento global, de estabelecer o fim do uso dos combustíveis fósseis, (vale lembrar que a mate da ONU é a extinção até 2050) restou frustrada em uma COP que foi realizada no oásis proporcionado pelo petróleo: Dubai. 

Ainda assim, no último dia da conferência foi aprovado um acordo que reconheceu, pela primeira vez, a necessidade de se abandonar o uso de combustíveis fósseis, estabelecendo, dentre os seus objetivos, a triplicação das energias renováveis e duplicação da eficiência energética até 2030 e, ainda, a transição, de forma justa, ordenada e equitativa dos combustíveis fósseis nos sistemas energéticos – nesse ponto importa registrar que não se determinou de que maneira isso iria ocorrer. Ademais, reconheceu a necessidade de descomissionar usinas de carvão, acelerar os investimentos em sistemas energéticos de baixo carbono, realizar aporte financeiro e tecnológico aos países em desenvolvimento no que se refere à transição energética, bem como de adaptação aos impactos das mudanças climáticas. 

Para tanto, o governo dos Estados Unidos anunciou medidas para reduzir em quase 80%, até 2038, a emissão de gás metano. Segundo a Agência Internacional de Energia, a indústria de petróleo é uma das principais causadoras da alta emissão de gás metano no mundo, sendo este o principal componente dos gases de efeito estufa e um dos responsáveis pelo aquecimento global e mudanças climáticas.

Cerca de 50 empresas, que representam 40% da produção global de petróleo, assinaram um compromisso de chegar a zero metano até 2050. Antônio Guterres, secretário geral da ONU, afirmou que o diagnóstico é claro. Em primeiro lugar, reduzir drasticamente as emissões. Exorto os países a acelerarem os seus calendários de zero emissões líquidas, de modo a atingirem esse objetivo até 2040 nos países desenvolvidos e até 2050 nas economias emergentes.

Contudo, em que pese o texto final trazer a percepção de que a fase do petróleo estaria chegando ao fim, não foram estabelecidas metas para a redução progressiva do uso de combustíveis fósseis, bem como não se limitou a abertura de novas frentes de exploração de petróleo ao redor do mundo, razão pela qual experts atentam para a urgência em conter as mudanças climáticas por meio de ações mais rápidas, como a mitigação e a adaptação.

O Brasil e o Reino Unido assinaram um acordo de cooperação para descarbonização da economia, o Hub de Hidrogênio Brasil-Reino Unido, que prevê o incentivo às energias limpas, bem como novas parcerias internacionais, garantindo cooperação com intercâmbio de conhecimentos técnicos e workshops para a promoção de descarbonização do setor industrial. 

Declaração sobre Agricultura Sustentável, Sistemas Resilientes e Ação Climática 

Em 1° de dezembro, em um compromisso inédito, foi assinada por 134 países, incluindo o Brasil, a Declaração sobre Agricultura Sustentável, Sistemas Resilientes e Ação Climática, em que se comprometeram a integrar o sistema alimentar e a agricultura nos seus planos climáticos até 2025. O foco é melhorar a segurança alimentar, reduzir a vulnerabilidade de agricultores diante dos eventos extremos e, simultaneamente, proteger a biodiversidade e a água.

 O compromisso reconhece a importância de implementação de programas de aquisição, pesquisa e inovação específicos para mulheres, crianças, jovens, povos indígenas, pequenos agricultores, agricultores familiares e pessoas com deficiência.

Na declaração em questão destaca-se que não há caminho para atingir os objetivos climáticos que não envolva os sistemas alimentares, a agricultura e ainda que o compromisso firmado ajudará a construir um sistema alimentar mundial adequado para o futuro.

Acordo de Paris 

Como se sabe, em 2015, 195 países estabeleceram a meta de limitar o aquecimento global a 1,5ºC, se comprometendo a reduzir gases de efeito estufa para evitar a crise climática. Em novembro, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) publicou seu relatório anual informando que o mundo pode enfrentar um aumento de temperatura de até 2,9ºC até 2100 se não houver mudanças nas políticas atuais.

Assim, na COP 28 foi elaborado um balanço global sobre o cumprimento das metas estabelecidas no Acordo de Paris – Global Stocktake (GST). Os relatos destacados na conferência concluem que China e a Índia continuam emitindo mais gases de efeito estufa a cada ano, enquanto os Estados Unidos e o Brasil conseguiram reduzir as emissões, mesmo que em pequena escala. 

O Brasil diminuiu 8% em suas emissões, com a redução do desmatamento, além de apresentar durante a Conferência alternativas para acelerar a descarbonização por meio da adoção de biocombustíveis, hidrogênio verde e um programa de restauração e manutenção de florestas. 

Ainda, o Acordo de Transição de Combustíveis Fósseis, já mencionado, fez referência a reduções de emissões de carbono e manifestou preocupação com o fato de o orçamento não ser suficiente para cumprir a meta do Acordo de Paris.

Respeitadas as circunstâncias específicas e o estágio de desenvolvimento de cada país, é possível falar em avanços, ainda que os meios para os efetivar não tenham ficado tão claros como se gostaria. Em destaque, cumpre registrar o olhar mais atento para a segurança alimentar e as condições das populações mais vulneráveis, bem como o inevitável caminho da transição energética rumo às fontes renováveis. Que os necessários arranjos regulatórios e institucionais sejam logo adotados para por em prática as medidas necessárias para materializar a consecução dos objetivos e temas discutidos. É o que se espera! 

Destaques da participação do Brasil

Plano de transição ecológica 

Anunciado pelo Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o Plano de Transição Ecológica, apresentado como uma proposta Sul Global, objetiva, em suma, fortalecer iniciativas de economia verde, promover o desenvolvimento sustentável, assim como, para fins de melhorar a qualidade do meio ambiente, estimular investimentos, sobretudo, em bioeconomia, agricultura e infraestrutura.

O plano se estrutura em seis eixos: financiamento sustentável, desenvolvimento tecnológico, bioeconomia, transição energética, economia circular e, por fim, infraestrutura e adaptação às mudanças climáticas. 

Entre as principais medidas previstas em cada eixo se destacam o mercado regulado de carbono, o Crédito do Fundo Nacional sobre Mudança do Clima e de outras fontes para inovação e transição ecológica, a política para o desenvolvimento da biotecnologia, um fundo internacional para preservação de florestas, a Política Nacional de Hidrogênio Verde, investimentos em transporte coletivo, regulamentação de créditos de reciclagem e, ainda, urbanização de favelas para prevenção de riscos de desastres.

Financiamento BNDES para a restauração de 24 milhões de hectares na Amazônia.

Aloizio Mercadante, presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), lançou no Espaço Brasil da COP-28 o programa “Arco da Restauração” objetivando a restauração na Amazônia em parceira com Ministério do Meio Ambiente de Mudança do Clima – MMA. O investimento propõe-se a restaurar 24 milhões de hectares na Amazônia até 2030, iniciando por Unidades de Conservação, Terras Indígenas e Quilombolas e áreas públicas não destinadas.

O BNDES firmou ainda memorandos de entendimento com o Banco Mundial (BIRD) e com o Banco Europeu de Investimento (BEI) visando o fortalecer a cooperação entre as instituições na busca de soluções de financiamento, troca de experiências, melhores práticas e identificação de projetos de interesse comum que podem resultar em até R$ 6,5 bilhões em novos investimentos verdes no Brasil. 

Inicialmente, os recursos do Fundo Clima irão se somar a outras fontes de apoio para investimentos de até R$ 51 bilhões. Até 2050 esperam-se investimentos de até R$ 200 bilhões.

1  Em inglês Conference of the Parties – COP, representa um encontro anual que, desde 1995, reúne representantes dos países signatários da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, estabelecida em 1992 e ratificada em 1994, que possui, dentre seus objetivos, (i) a tomada de decisões (válidas e obrigatórias apenas se aprovadas em votação unânime); (i) o exame periódico do cumprimento de obrigações das Partes; (iii) o estabelecimento de mecanismos institucionais para enfrentamento das mudanças climáticas e de seus efeitos; (iv) o intercâmbio de informações; (v) promover orientação para o desenvolvimento e aprimoramento de tecnologia; (vi) exame e emissão de relatórios periódicos de implementação de suas decisões; e (vii) estabelecimento de uma agenda global, dentre outros temas relacionados. 
2  Disponível em  https://unfccc.int/sites/default/files/resource/cma2023_L17_adv.pdf?download acesso em dez/23.

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