Da redação
Realizada entre 5 e 16 de junho de 1972 na capital da Suécia, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano – conhecida por Conferência de Estocolmo – foi a primeira grande reunião de chefes de Estado organizada pela ONU para tratar das questões ligadas à degradação ambiental. É, pois, considerada um marco seja na popularização seja na internacionalização da problemática ambiental, que a partir de então entraria, definitivamente, para a agenda das políticas públicas adotadas e discutidas no mundo inteiro.
Muitos foram os fatores, naquele contexto, que conduziram à conferência: a ampliação do conhecimento científico ocorrida nos anos de 1960 sobre as ameaças e os prejuízos de caráter irreversível à biosfera, referentes às mudanças climáticas e aos problemas da quantidade/qualidade das águas; o aumento da publicidade e/ou divulgação de acidentes ecológicos de grandes proporções, como a intoxicação de mercúrio de pescadores e suas famílias em Minamata, no Japão, ou os danos causados nas costas inglesas e francesas pelo naufrágio de um navio petroleiro; o acelerado crescimento econômico do pós-guerra impactando os países periféricos, e, por consequência, populações tradicionais, com o aumento do êxodo rural e o inchaço desordenado das zonas urbanas; a constatação de que os problemas ambientais ultrapassam as fronteiras dos limites nacionais (chuvas ácidas, poluição dos mares, acumulação de metais pesados e pesticidas), cujas soluções demandariam, portanto, uma cooperação internacional.
Tiveram grande repercussão, nesse cenário de alerta a danos ambientais, obras como Silent Spring de Rachel Carson, publicada em 1962, e o relatório Limites do Crescimento, elaborado por uma equipe do Instituto de Tecnologia da Massachusetts (MIT), contratada pelo Clube de Roma, e amplamente divulgado a partir de 1972. Não por acaso, o debate apoiado, por um lado, em teses conservacionistas – que, a exemplo do Clube de Roma, viam no crescimento econômico a fonte do esgotamento do meio ambiente – e, por outro, nas ideias desenvolvimentistas – que, como o Brasil, sob a vigência de um regime autocrático, defendiam que, no crescimento econômico/tecnológico, encontrava-se o caminho para corrigir os desequilíbrios sociais e ambientais – não só agitou os encontros preparatórios para a Conferência de Estocolmo como também acabou norteando seus principais resultados. É por isso que, embora tenha ocorrido num contexto de “Guerra Fria” ainda regido pelo conflito leste/comunista versus oeste/capitalista, da primeira conferência, realizada no âmbito da ONU, para tratar o meio ambiente tenha emergido, de modo tão inequívoco, o conflito norte-sul, ou seja, entre os países ricos/desenvolvidos e os países pobres/em desenvolvimento.
A despeito de suas incipiências e indefinições, essa conferência imprimiu uma nova postura sobre a questão ambiental, em nível internacional: os Estados participantes reconheceram o meio ambiente do planeta como um problema comum, e sobre o qual se precisava agir. Na “Declaração de Estocolmo”, que se constituiu como um marco jurídico mundial, foram estipulados responsabilidades e princípios que orientariam a comunidade internacional. Por pressão dos países em desenvolvimento, ficaram rejeitadas políticas uniformes de desenvolvimento formuladas por países industrializados, que não respeitavam especificidades locais, que deveriam ser levadas em conta nas estratégias tanto de desenvolvimento quanto de preservação ambiental. Nesse sentido, as soberanias dos Estados quanto à exploração de seus recursos naturais foram reafirmadas, desde que seguissem normas acordadas na política ambiental internacional. Foi ainda votada uma resolução acerca de aspectos financeiros e organizacionais, com a criação de um organismo especialmente voltado para coordenar as atividades da ONU na área do meio ambiente, o PNUMA – Programa das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente, que ficou, obviamente, incumbido de cuidar também do “Plano de Vigilância” então estabelecido.
Embora tais medidas de proteção e de cooperação internacional não tenham progredido de forma mais expressiva no período pós-conferência, são inegáveis as mudanças na abordagem ambiental a partir da reunião de Estocolmo. Por exemplo, na maioria dos países, a proteção do meio ambiente se institucionalizou, com a criação de órgãos estatais, agências ou ministérios na área do meio ambiente, sem falar da significativa ampliação do debate ambiental na sociedade civil, e da crescente relevância do papel das ONGs ambientalistas nas estratégias políticas envolvidas na díade meio ambiente/desenvolvimento socioeconômico (sustentável). A Conferência de Estocolmo constituiu, aliás, a primeira ponte entre os direitos humanos e o meio ambiente. Desde então, a qualidade ambiental passou a integrar as discussões e as agendas políticas de todas as nações e de suas relações transnacionais, na medida em que se tornou também um direito fundamental, ou seja, visto como indissociável à própria qualidade da vida humana.
Para além da celebração do legado da Conferência de Estocolmo – que sob o lema “Uma Só Terra” já alertava sobre os riscos e os impactos que os nossos modos de vida significavam para o meio ambiente -, a Estocolmo+50: “um planeta saudável para a prosperidade de todos e todas – nossa responsabilidade, nossa oportunidade”, realizou-se nos dias 2 e 3 de junho de 2022, novamente na capital sueca, com o intuito de aprofundar de forma efetiva a dimensão ambiental do desenvolvimento sustentável para acelerar os compromissos impostergáveis (incluindo uma recuperação sustentável da pandemia de Covid-19), sobretudo, na atual Década da Ação, mais do que estabelecida, constatada, comprovada cientificamente, em muitos dos acordos e reuniões internacionais que vêm sucedendo, ao longo de meio século, a reunião de 1972, na luta essencial dos esforços contra a degradação ambiental.
Fontes consultadas:
https://www.unep.org/pt-br/noticias-e-reportagens/comunicado-de-imprensa/estocolmo50-reuniao-internacional-para-acelerar-acao
https://periodicos.unifor.br/rca/article/view/293
https://www.terrabrasilis.org.br/ecotecadigital/pdf/conferencia-de-estocolmo-um-marco-na-questao-ambiental.pdf
https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-internacional/a-conferencia-de-estocolmo-1972-para-o-direito-ambiental-do-brasil/#_ftn1