75_Post_2dezembro2022
Milaré

Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica – COP-15

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Da redação

Embora ainda não tenha a atenção pública equivalente à das mudanças climáticas, é crescente a preocupação da comunidade internacional em relação à perda da biodiversidade, que, de acordo com o relatório do Fórum Econômico Mundial de 2022, constitui um dos três maiores riscos globais dos próximos dez anos. Já existe, de todo modo, um consenso, afiançado nos principais encontros internacionais na área de meio ambiente, de que as ações de enfrentamento das mudanças climáticas e da perda da biodiversidade precisam caminhar integradas e com igual urgência.

Definida em termos de genes, espécies e ecossistemas, a diversidade biológica tem um papel cada vez mais relevante na produção agrícola, para a pesquisa e desenvolvimento de novos produtos (como medicamentos, cosméticos, compostos químicos, entre outros) e, sobretudo, nas respostas e soluções adaptativas às próprias alterações ambientais. O impacto que as atividades antrópicas exercem na variedade de vida na Terra, isto é, o processo de consumo humano excessivo dos recursos naturais, entrou em pauta, pela primeira vez, durante a Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente Humano, ocorrida em Estocolmo, em 1972. No entanto, a criação de um instrumento legal específico que visasse controlar tal processo só se daria, anos mais tarde, na ECO-92 – a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento –, realizada no Rio de Janeiro, quando, então, foi instituída a Convenção da Diversidade Biológica (CDB). Em vigor desde dezembro de 1993, esse tratado multilateral estabelece regras comprometidas com três princípios fundamentais: a conservação da biodiversidade, o seu uso sustentável, e a repartição justa e equitativa dos benefícios do uso dos recursos genéticos, observada a soberania de cada nação sobre o respectivo patrimônio. A CDB prevê ainda os direitos e as obrigações dos países signatários concernentes à cooperação científica e tecnológica e aos investimentos necessários para conservar a diversidade biológica.

Depois de uma série de adiamentos, em virtude da pandemia, a Conferência das Partes sobre Biodiversidade – COP-15, presidida pela China, cujas reuniões preparatórias se deram de forma híbrida, ocorrerá em Montreal (Canadá) entre 7 e 19 de dezembro deste ano, quando, então, serão acordadas as modificações, ainda com muitas pendências, a serem adotadas no âmbito da CDB. O que está em jogo é, principalmente, a definição do Marco Global de Biodiversidade Pós 2020, que visa, por meio de 21 metas para 2030 e quatro objetivos de longo prazo até 2050, não apenas reduzir mas também reverter a perda de biodiversidade agravada no mundo todo. Para essa reformulação foi decisivo o quinto Panorama da Biodiversidade Global (GBO-5), um relatório publicado pela CDB em 2020, que avaliava as Metas de Aichi – o último plano estratégico para a biodiversidade, que fora aprovado durante a COP-10, em Nagoya, em 2010, e destinado ao período de 2011 a 2020. Segundo o GBO-5, ainda que tenham ocorrido importantes avanços em alguns países, ao longo desses anos, a maioria das metas não se conseguiu cumprir.

Em conformidade com os princípios basilares da CDB, que dialogam com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, na reunião da COP-15, que colocará na mesa de negociações, em Montreal, governos e empresas de todo mundo para pactuar a nova “agenda” global da biodiversidade pós 2020, encontram-se dispostas entre as metas para 2030: a conservação de, pelo menos, 30% das áreas terrestres, marinhas e costeiras do mundo; a restauração de, no mínimo, 20% dos ecossistemas marinhos, de água doce e terrestres degradados, em especial, aqueles responsáveis por serviços ecossistêmicos fundamentais; a redução de metade da taxa de introdução de espécies invasoras conhecidas e/ou potenciais; a diminuição, ao menos, de metade dos nutrientes perdidos para o meio ambiente; a redução significativa da poluição advinda da agricultura (do uso de produtos químicos, em particular, de pesticidas) e o fim do despejo de resíduos plásticos; a determinação de minimizar o impacto das mudanças climáticas na biodiversidade, e, na mesma medida, por meio de soluções baseadas na natureza, nos ecossistemas, de contribuir para a mitigação e adaptação em relação a essas alterações; o aumento de 200 bilhões de dólares nos fluxos financeiros internacionais em prol da biodiversidade, destinados, sobretudo, aos países em desenvolvimento.

Não apenas a mobilização de recursos financeiros – aliás, antiga reinvindicação dos países em desenvolvimento em relação aos países desenvolvidos – será alvo de debate na COP-15, mas também aquela referente ao compartilhamento dos benefícios (tanto monetários quanto não-monetários) oriundos do uso de recursos genéticos, que, segundo a CDB, e seus acordos complementares, principalmente o Protocolo de Nagoya sobre Acesso a Recursos Genéticos e Repartição de Benefícios (ABS), também adotado em 2010, deve ser feito condicionalmente de forma justa e equitativa. O Brasil, um país em desenvolvimento que apenas em 2021 ratificou o Protocolo de Nagoya, mas que ainda conta com a maior biodiversidade do mundo, precisa estar conectado com os desdobramentos dessa discussão. Cabe destacar que esse protocolo abarca também o conhecimento tradicional associado aos recursos genéticos, contemplando, assim, o direito estabelecido das comunidades indígenas e locais de conceder o acesso a eles. As partes contratantes devem garantir o consentimento prévio e informado dessas comunidades e a repartição dos benefícios, respeitando as leis e os procedimentos comunitários. A proteção do direito dessas populações é, portanto, peça-chave para se alcançar a estrutura global de biodiversidade pós 2020, tendo em vista que a maior parte da biodiversidade conservada hoje se encontra em seus territórios e que elas detêm as práticas mais sustentáveis no uso dos recursos naturais, que precisam ser não só compartilhadas, mas absorvidas e ampliadas.

São muitos os desafios para que a “visão de 2050” – de modos de vida mais harmônicos com a natureza – não seja apenas e tão somente uma miragem. A exemplo do que o Acordo de Paris representou para as mudanças climáticas, a COP-15 tem a pretensão, com este novo marco global, de colocar a biodiversidade em foco, estabelecendo métricas mais objetivas, capazes, inclusive, de medir o custo dos impactos, e ações mais transversais e integradas, que incentivem os países a criar metas específicas, legislações locais, órgãos de controle competentes, incentivos a instituições de monitoramento, pesquisa e de cooperação internacional, compromissos de setores produtivos, espaços e garantias para os povos originários e comunidades tradicionais e para os seus saberes.

Fontes consultadas:
https://oeco.org.br/dicionario-ambiental/28347-o-que-e-a-convencao-sobre-a-diversidade-biologica/
https://www.cbd.int/abs/
https://ciclovivo.com.br/planeta/meio-ambiente/cop15-propoe-marco-global-para-protecao-da-biodiversidade/
https://www.mulherespelosoceanos.com.br/post/cop-15-o-que-esperar-do-novo-acordo-global-de-biodiversidade
https://www.iberdrola.com/sustentabilidade/meio-ambiente/iberdrola-biodiversidade/cop15

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